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sexta-feira, 27 de setembro de 2013

A Invenção



Dentro daquele inferno cristão havia apenas um homem. Alto, forte e resistente, adaptado àquele trabalho que poucos conseguiriam suportar. Pegou a pá, que estava tão quente que outros humanos não conseguiriam fazer o mesmo, ao menos não sem um grito de dor e uma desesperada busca por ataduras. Seu corpo, porém, estava acostumado ao calor e não se queimava mais. A pele, já definitivamente avermelhada pelo contato contínuo com tão altas temperaturas, tornara-se resistente aos efeitos deste calor quase a um nível sobre-humano. Pegou mais uma grande porção de carvânico, um tipo de carvão concentrado criado pelos cientistas de sua época, que queimava por muito mais tempo e muito mais quente que o carvão comum, e que era muito mais pesado também, ao ponto de crianças desafiarem umas às outras em desafios de força, a tentarem erguer mais de um torrão ao mesmo tempo — e muitas não levantavam sequer o primeiro torrão. Ele alimentou a fornalha e ficou observando as chamas. Já a 12 horas estava ali. Não sabia o que transportavam, mas sabia que era algo importante, e no fundo orgulhava-se de fazer parte daquela comitiva, ainda que de modo anônimo. Pois ele sabia que eram realmente poucos os que conseguiriam fazer o seu trabalho, e da maneira como ele o fazia.
E por isso era ele o responsável pela fornalha daquele trem.
Porque havia muita pressa e poucas mãos. E nenhuma mais forte ou resistente do que a dele.
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No teto do terceiro vagão havia uma abertura, para quem precisasse subir no trem a partir da parte de dentro. Normalmente era utilizada para limpeza, mas dessa vez não. Dessa vez ela fora aberta com a locomotiva em movimento, e um exímio atirador limpava seu rifle sentado, tranquilamente, no teto do trem em movimento. A velocidade era constante — a máxima — o que facilitava um cálculo mais tranquilo da velocidade do vento e de sua influência sobre as balas que seriam disparadas. E não havia dúvidas, elas seriam disparadas. Sua intuição nunca mentia.
Ele observou a arma, olhou para as outras duas à cintura, e gostou do que via. Testou o maquinário das duas armas ocultas nas mangas, e aproveitou para observar a luz do sol no brilho prateado das duas. Guardou o rifle no coldre magnético das costas e pegou o outro rifle das costas para iniciar sua limpeza. Números ímpares lhe davam azar, e por isso suas armas eram sempre em pares. Sempre armas gêmeas. Assim como eram dois os seus olhos, e funcionavam ambos muito bem. E por funcionarem tão bem eles viram o que vinha atrás do trem, distinguindo seus inimigos, seus rostos e suas armas, a uma distância que impossibilitaria outros de fazerem o mesmo. Mas ele não era os outros. Para tristeza dos que se aproximavam.
Tomou um gole do whisky amargo e vagabundo, olhou para o lado e a tranquilidade desapareceu.
Hora de trabalhar.
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Ela palitava os dentes com uma bela faca, completamente feita de metal. Até mesmo o cabo. Metal negro.
O conjunto de 5 facas havia sido presente do cientista, feito com o que restara da invenção que carregavam. O metal era precioso demais ser deixado sem forma, segundo ele. Ela sabia que ele estava querendo algo mais com isso, ainda que não fosse realmente tentar alguma coisa. Era sua melhor arma aquela, a mais afiada — a sedução. Seguida de perto pela falsa inocência. Quando mais jovem costumava ficar chateada pelo lento desenvolvimento do seu corpo, insegura quando se comparava com as amigas, mas o tempo provou que aquilo vinha a seu favor. Afinal, seus rosto e corpo infantis permitiam que ela se fingisse de indefesa sempre que necessário. E quando resolvida ser sensual não importava o corpo, apenas ser mulher era suficiente contra a grande maioria dos homens.
Ela observou novamente a faca, sentiu seu peso balanceado, e a atirou contra a porta do vagão. O estranho metal negro perfurou o aço como se fosse manteiga em 5 lugares diferentes, as 5 facas formando um círculo perfeito. Um observador atento não a teria visto sacar as outras facas. Ela esticou a mão na direção das facas, uma de cada vez, e elas voaram de volta à sua mão. Um tipo diferente de magnetismo, muito forte e preciso, que apenas funcionava com aquele metal. Através dos buracos, seu olhar encontrara o do cientista. Talvez ele conseguisse o que queria. Seria bom ter uma reserva maior destas belezas afiadas.
E já havia feito mais por menos para chegar até ali.
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O cientista vivia um misto de preocupação e ansiedade. Aquele não era o seu estilo de vida, não era um aventureiro, sempre na tênue linha entre a vida e a morte, decidindo isso na força, precisão ou velocidade das mãos. Ele sobrevivia com o cérebro, e ainda que os pensamentos sejam rápidos, a velocidade do raciocínio nunca é igual à agilidade da execução. Fato especialmente verídico, no caso dele.  No entanto, mesmo com a vida em risco, sabia que a preocupação era maior do que deveria. Estava com os melhores, afinal. E caso eles não fossem suficientes, bem, nesse caso ele faria o teste prático de sua invenção, e se ISSO não fosse suficiente para salvar sua vida, bem, então não seria também importante o suficiente para justificar tal empreitada. Entretanto, a empresa existia.
E enquanto ele devaneava sobre sua capacidade e como ele usaria isso para chegar à bela jovem do outro lado da porta, o trem tremeu, se inclinou e tombou, ainda em movimento. Pois nenhuma arma ou lenda conseguiria impedir um avião à distância, quando este seguia convicto em direção a um destino e, literalmente, se atirava sobre ele.
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No horizonte via-se a cidadela do cobre, para onde se encaminhava a locomotiva. Mas ela não chegaria ao seu destino.
No lado de dentro das ferragens, o atirador sentia a fisgada na perna esmagada e, com certeza, perfurada. A garota conseguira sair com o cientista, graças a ele — e à agilidade felina da moça, tinha de assumir — mas ele não. Os dois grandes carros os alcançaram, e chegaram atirando. Várias motos chegaram também, reforçando o grupo inimigo. Na verdade, eles já pareciam um pequeno exército. Os tiros foram bloqueados por uma grande placa de metal sustentada pelos braços de um homem moreno-avermelhado, e ela reconheceu no instante seguinte a porta do primeiro vagão, a porta da fornalha. A porta do inferno.
Deixando o cientista em segurança atrás do escudo improvisado ela correu lateralmente, arremessando uma faca, que atravessou o peito de um dos atiradores inimigos. A faca ainda voou por um momento, dois atiradores ao lado do morto miraram nela, e ela esticou o braço. A faca, ainda no ar, girou numa parábola e retornou para atravessar um segundo atirador. Ela não parara de correr, para evitar os tiros do terceiro inimigo, mas estes não vieram. O inimigo, assim como outros 5 ao redor dele, estavam caindo com tiros no peito ou na cabeça.
Até que era útil ter um exímio atirador no próprio time também.
Vendo que ele precisaria de tempo para recarregar suas pistolas, ela puxou as outras 4 facas e se colocou entre o aliado caído e os inimigos. E só então percebeu o cientista encolhido debaixo do grandalhão, que se esforçava por protege-lo. Ela arremessou as facas enquanto corria na direção dos inimigos, se desviando dos tiros. Foi atingida no braço esquerdo, mas ainda tinha o outro braço, o que deveria ser suficiente. Ela pulava como um macaco entre os inimigos, recebendo apenas ferimentos de raspão enquanto os derrubada. O fato era que, enquanto eram úteis a distância, também eram inúteis àquela distância as armas inimigas. Principalmente porque, cada vez que erravam um tiro, atingiam um aliado ao invés da inimiga.
O esforço, porém, aumentava sua circulação sanguínea, e os ferimentos jorravam o precioso líquido vermelho. E ela enfraquecia. E a velocidade diminuía.
Quando achou, porém, que não conseguiria mais lutar, percebeu que também não precisaria. Pois um tiro na lateral da cá cabeça do inimigo à sua frente mostrou a ela que o atirador estava pronto novamente. Ela recuou de costas, ainda lutando, enquanto balas zuniam bem próximas de suas orelhas, nunca precisando de dois tiros no mesmo oponente. Chegando de volta ao que restara do trem ela viu o motivo da demora para a recarga. O atirador não apenas havia recarregado suas armas, mas também se posicionado de forma melhor. O grandalhão aproveitara a distração dos inimigos — ou seja, ela — para tirar o atirador das ferragens. Ele agora atirava escondido, utilizando pós destroços como trincheira. O cientista ainda se encolhia de medo, até que a ponta de uma bota encontrou seu estômago.
"Nós estamos morrendo por uma arma que não serve pra nada?"
O pânico havia falado mais alto, e apenas aquele chute o tirara do torpor que a surpresa causa a quem não está acostumado a combates. O cientista, então, apalpou os bolsos e encontrou dois pequenos cilindros metálicos, que enfiou em equipamentos presos aos antebraços, por dentro das mangas. E apertou um botão na placa que trazia no peito, também por baixo da roupa. E um grande estrondo de metais de batendo veio de dentro do carro-laboratório. No segundo estrondo o teto se rasgou.
O terceiro estrondo foi a saída definitiva daquela armadura negra.
A garota não saberia dizer se sentia deslumbre ou angústia. E depois soube dizer. Sentia medo.
Uma faca atravessara sua garganta, indo se fincar aos pés do cientista. O metal da armadura era o mesmo das facas. O magnetismo era o mesmo também.
Em choque, o cientista soltou o botão do cinto, e a armadura foi ao chão. Sem alguém que lhe desse cobertura, o atirador foi cercado pelos inimigos e fuzilado. Era perigoso demais para sobreviver. O cientista e o grandalhão haviam sido rendidos. Até que o grandalhão esmagou a cabeça do cientista contra a ferragem mais próxima.
"Vocês podem roubar a tecnologia, mas não o conhecimento." - E ainda matou uma dúzia de inimigos antes de o matarem.
A missão, porém, tinha sido um sucesso. Afinal, a sociedade continuaria refém do vapor. E do carvânico. Além do mais, o grupo ouvira dizer que o tal cientista tinha um aprendiz. E a informação era quase correta. Era UMA aprendiz.
E até que ela fosse encontrada, os segredos da eletricidade e do eletromagnetismo estariam bem guardados nas mãos de sujos colecionadores.

Um comentário:

  1. Começando a colocar os contos de Steampunk no blog
    Temos que mudar a temática da página tb...

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